Era uma vez um menino que nasceu na Ilha do Governador e gostava muito de jogar bola. Descalço, corria o dia inteiro, parando apenas para comer e dormir. Ele cresceu, virou uma estrela e atraiu para si uma legião de admiradores. Falando assim, resumidamente, fica até sem graça. Por isso mesmo Nilton Santos teve uma grande ideia. Escrever um livro, contando as suas histórias. Como isso aconteceu? Esse capítulo nós contamos e foi mais ou menos assim:
Carlos Eduardo Pereira,
ex-presidente do Botafogo (2015-2017), tinha uma adoração pelo Nilton. Seus
pais, Hugo e Gloria, também aparecem na dedicatória do Minha Bola Minha Vida.
Sócios do clube, o casal frequentava a sede e desfrutava da constelação de
craques alvinegros da época. Depois que Nilton mudou-se para Brasília, quem
costurou a reaproximação foi um jornalista alvinegro da capital federal.
“A minha aproximação com o Nilton
foi através de um amigo em comum: o jornalista Jorge Martins Ferreira, que
assinava uma coluna em Brasília, era o “crocodilo”. Ele também era um
botafoguense apaixonado. Eu fazia parte de um grupo chamado Botafogo, Força e Renovação
e nós trocávamos informações sobre o clube e política. Em uma viagem a Brasília
com o Botafogo, Jorge me disse que o Nilton tinha o livro quase pronto, mas não
sabia como dar o encaminhamento. Indiquei o Guilherme Zincone, que era um amigo
de infância, cuja família era fundadora e proprietária da editora forense”,
relembra Carlos Eduardo Pereira, em entrevista por telefone.
Guilherme usou o selo
Gryphus e, a partir de então, se empenhou em fazer a ideia sair do papel. Segundo
o editor, o trabalho foi feito da seguinte forma: “Nilton contava contos bem
organizados por personagens como João Havelange, Garrincha, Carlito Rocha, etc.
Ele ia contando várias histórias curiosas e interessantes de cada um desses
personagens que ele tinha convivido na seleção e no Botafogo”, disse.
Ele e Nilton se conheceram em um
restaurante no aeroporto de Brasília. O jornalista intermediou o encontro.
Horas depois, decidiram como fariam o livro. “Nilton disse que não conseguiria
contar as histórias de maneira forçada. Então, o Jorge Martins gravava as
conversas e passava para eu transcrever. Foram, mais ou menos, quatro meses de
gravações na casa de Araruama e dois de edição e produção do livro na gráfica,
explicou Zincone.
O fenômeno Nilton Santos
No dia 3 de agosto de 1998, o casarão
de General Severiano se enfeitava para a festa. A espera era enorme, mas a
Enciclopédia do Futebol extrapolou todas as expectativas possíveis (ver cobertura aqui).
“Foi o maior lançamento de livros
que eu já vi na minha vida. O que aconteceu eu considero um fenômeno. O
lançamento começou às cinco horas da tarde e o limite era meia noite. A
expectativa era de 300 livros. Mas, achava que devíamos levar mil exemplares
para o dia. Todos ficaram horrorizados na hora, mas aceitaram. A fila no salão
era um caracol que dava voltas, saía lá fora e ia pelo jardim. Eu tinha
separado 12 para jornalistas e, por volta das dez horas, os 988 já tinham sido vendidos,
foi incrível! Era 1h30 da manhã e tinha gente na fila por um
autógrafo”, exalta-se Guilherme Zincone.
O jornalista Ricardo Linhares, que
também participou da pesquisa do livro, guarda o dia como um momento muito
especial:
“Meu pai (Itamar) foi quem me
passou a paixão pelo Botafogo, que transmiti ao meu filho Gustavo. Fazia mais
de uma década que ele não ia aos estádios e sair à noite de casa era raríssimo.
Preparei um discurso e fui perguntar se não queria ir comigo ao lançamento. Ele
me cortou bem no início: “O Nílton Santos vai estar lá?”. Respondi que sim, e
ele emendou: “Então eu vou!”. Quando chegou a hora de pegar o autógrafo, Dona Coeli
informou ao Nilton que aquele senhor era meu pai. Ele, sempre contido em suas
emoções, ficou com a voz embargada e os olhos úmidos ao agradecer por tudo que
o ídolo fez pelo Botafogo. O Nilton, talvez por ver alguém próximo de sua idade
(meu pai era seis anos mais novo), levantou-se e disse: “Eu que agradeço pelo
apoio em todos esses anos que joguei lá”. Eles se cumprimentaram longamente,
ambos emocionados”, revelou Linhares.
Pouco tempo depois, a Gryphus fez
contato com torcedores alvinegros pelo país e organizou uma excursão de
divulgação. “Quando surgiu a notícia de
que ele poderia fazer o lançamento em Belém do Pará, ficaram doidos. Se eu não
me engano, a editora não pagou nenhuma estadia, refeição, nada, pois quando
sabiam que o Nilton iria, aparecia um botafoguense que bancava e chamava para
ficar na casa. Ele era um ídolo mesmo, as pessoas o adoravam”, conta-nos o
editor.
O livro foi um sucesso estrondoso
da editora, que resolveu apostar em outras biografias de personalidades
esportivas nos anos seguintes. De acordo com Zincone, foram vendidos
mais de dez mil exemplares no primeiro ano. Em 2014, a Gryphus fez uma nova
edição com capa redesenhada.
Naquele dia, eu disse ao Nilton:
“Só duas camisas: a do Botafogo e do Brasil, não é?” e ele me respondeu:
“Carlinhos, eu sempre me senti muito mais confortável com a camisa do
Botafogo”. Alguém que diz uma coisa dessas, é para endeusar, tem que honrar uma
pessoa assim, finalizou Carlos Eduardo Pereira.
Para quem ainda não adquiriu a
obra Minha Bola Minha Vida, fica a dica. Ela encontra-se à venda na página da editora (ver aqui) e nas principais livrarias do país. Este ainda pode ser um belo
presente para o dia dos pais.
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